05 novembro, 2012

Dúvida


se me calar agora,
se não te disser nada,
se deixar falar em meu lugar todas as vozes
da polifonia imprevisível dos dias,
até a minha voz se tornar imperceptível,
um eco, um rumor,
pouco mais que nada.
se me calar agora,
será que vais ouvir
em cada palavra por dizer
o desejo em flor
que no meu corpo amadurece?

se te calares agora,
se não me disseres nada,
se o teu silêncio entrar
pelas portas e janelas
que a tua voz em mim abriu
de par em par,
e com ele o frio
e com ele os pássaros que bebem a sede
nos umbrais, nas veias, nos beirais.
se te calares agora,
será que vou saber
em cada palavra que não dizes
o segredo que o teu corpo
em cada gesto amanhece?

se a distância correr entre nós
como um rio,
e nos afastar por fora
e nos habitar por dentro:
lodo nos meus dedos,
peixes nos teus olhos.
será que o meu desejo se vai diluir,
nos peixes dos teus olhos rasos de água?
será que os teus gestos se vão desfazer em cinzas,
no lodo das minhas mãos fechadas?


Sem comentários: