hoje o meu cansaço é daqueles que tem raízes antigas e profundas, daqueles que continua a doer no corpo mesmo depois de dormir. [daqueles que quase me faria escrever (te).]
hoje o meu cansaço é também mais lúcido: vejo como me tenho deixado governar pelo trabalho e não tenho respeitado os meus limites, vejo que tudo o que me dói é falta de liberdade. falta de liberdade se só tenho tempo para trabalhar e se me desiludo como se tudo dependesse de mim. falta de liberdade se vivo centrada na minha vidinha, neste círculo fechado e pequeno onde só cabem as minhas necessidades urgentes, as minhas pessoas ausentes, as minhas dores, os meus cansaços, os meus objectivos. falta de liberdade se me iludo com os meus desejos e invento papéis para os outros, e desespero com a espera, e me angustio com as ausências e com a liberdade dos outros. [por que é tão difícil respeitar a liberdade dos outros de ficar ou de partir?]. falta de liberdade se por desilusão me isolo e ignoro a vida que chama lá fora todos os dias: tenta mais, faz mais, vive mais, dá mais! falta de liberdade se me ocupo e ignoro a vida que me chama cá dentro: acredita mais, faz melhor, vive em paz, dá gratuitamente!
no meio do cansaço percebi também que preciso muito desse lugar chamado casa e que esse lugar não é simplesmente um lugar-lugar, mas sim um lugar-pessoas. a minha casa é onde estão as minhas pessoas-casa. e quando estou muito cansada descanso melhor se estou ao lado delas. às vezes não preciso sequer de desabafar com elas, basta-me estar com elas e ouvi-las e falar das coisas banais dos dias e das coisas importantes que nos angustiam, que nos movem, que nos comovem, basta-me estar com elas sem dizer nada para me sentir em casa e ficar melhor. [se o cansaço me faz olhar melhor para mim, para os dias e para os outros, então não pode ser mau. afinal, nada é só bom ou só mau.]
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