01 junho, 2006

A Alquimia da dor

As salas de espera são sempre férteis em revistas muito desactualizadas... assim encontrei uma revista de janeiro de 2006 com um artigo intitulado Alquimia da dor... sobre um livro com o mesmo título de uma professora de Budismo chamada Tsering Paldron... aqui ficam algumas passagens do artigo...

"«para muita gente ser feliz é não sofrer. Por isso, ser feliz é impossível. Vivemos num mundo onde o sofrimento é omnipresente: não há recanto, país ou latitude onde possamos escapar-lhe. Não existe remédio, terapia ou droga que nos ponha ao abrigo dele, e irrompe na nossa vida quando menos esperamos». Para os budistas, «o grande paradoxo da existência é que, embora ninguém queira sofrer, a sobrevivência faz-se à custa do sofrimento»."
"Os ensinamentos de Buda tentam levar-nos a perceber que «a natureza do mundo é sofrimento, por isso é inútil esperar que a felicidade possa dele porvir. Não são os objectos - obtidos à custa de sofrimento - que nos podem dar felicidade. Não são os fenómenos - efémeros e passageiros - que nos podem dar serenidade. Se queremos alcançar a felicidade, temos de apostar no próprio espírito, que é onde nasce todo o sofrimento e toda a felicidade»."

"não é por acaso que os momentos de maior sofrimento são também os mais ricos em tomadas de consciência - o que indica que o sofrimento pode ter um efeito salutar e um papel importante na nossa vida"
"a grande alquimia do sofrimento reside no facto de, para o transformarmos, termos de nos deixar transformar por ele."

"quando o sofrimento surge, estamos prontos para procurar o culpado, acusar toda a gente, mover acções em tribunal. Procuramos assim alívio, mas na realidade só estamos a piorar a situação: «Se usarmos toda essa energia para aprendermos a dominar o nosso espírito e para evitarmos que este continue a destruir-nos, o resultado será mais positivo»"

"Nada neste mundo é permanente, e o budismo aconselha a pensar que todas as situações por mais terríveis que sejam, tem uma duração limitada. Acabam por passar. Pensar que uma dada circunstância negativa vai durar muito tempo faz-nos sofrer mais."

"«nem tudo é totalmente bom nem totalmente mau»"

"Outro dos nossos grandes erros, à luz da doutrina budista, é a rejeição do sofrimento. «Habituámo-nos ao happy ending e achamos que temos direito a ele. Ficamos frustrados quando a história acaba mal porque desde crianças nos prometem que seremos felizes para sempre. (...) «estaremos mais preparados para enfrentar o sofrimento se soubermos que ele existe, que não lhe somos imunes, que nada nos garante que não venha bater-nos à porta. O síndroma do happy ending leva-nos a reagir como meninos mimados nos momentos difíceis. Tornámo-nos seres tão frágeis que se alguém se oferecesse para ficar com o nosso sofrimento aceitaríamos sem hesitar».
O budismo propõe várias técnicas para nos ajudar a transformar o sofrimento. Mas a principal é nunca esquecermos que receberemos sempre o resultado das nossas acções - sejam elas positivas ou negativas. E que para conseguirmos alcançar a paz e a serenidade temos de saber controlar o nosso espírito - pois só assim conseguiremos uma verdadeira alquimia da dor.»"

(texto de Sofia Barrocas)


Pois, gostei tanto do artigo que não resisti... fez-me pensar... nesta sociedade onde a todo momento nos exigem que sejamos felizes (ou que nos divirtamos… porque existe muita confusão entre diversão e felicidade… quando a mim me parece que a felicidade andaria mais próxima da serenidade por exemplo) e ao mesmo tempo não nos preparam para lidar com a dor… nem com a nossa nem com a dos outros…
Porque ficamos geralmente tão embaraçados com a dor dos outros, com as lágrimas dos outros? Porque perdemos tanto tempo a pesar dores na balança e somos tantas vezes incapazes de perceber a dor do outro? Porque nos envergonhamos da nossa própria dor?

Parece-me que uma boa dose de aceitação (nota: aceitação é diferente de resignação) e perseverança devem ser úteis neste processo em que transformamos a dor… ou em que nos deixamos transformar por ela… seremos nós capazes desse atrevimento?… de não comprarmos a cultura da eterna euforia e de procurarmos a felicidade através de um caminho em que se conhece, aceita, e encara a dor com naturalidade e sabedoria?

1 comentário:

ÐDC¨* disse...

Grande post :-)

Eu sempre te disse: Lembra-te do símbolo do gin-gan.
Gosto da filosofia budista, também Buda não era assim muito diferente de Cristo...Nós é que estamos ocidentalizados...Eu acho que os Orientais tem muito para nos ensinar, para empeçar: Atingir o êxito, é sermos melhores pessoas, e não sermos milionários.
Alguma vez viste o filme: Sete anos no Tibet??

Ainda nos falta muito para chegar lá...mas vamos fazendo o intento.
Beijinho.

P.S: Pois é!! de cada cultura devemos comprar só o que interesa...Como da moda!