29 junho, 2006

dou por mim a contar os dias,
hoje é o dia três,
tento combater o cansaço
que me vai cozendo os ossos
em banho-maria,
mas não muito, fico cansada.
esqueço-me de muitas coisas,
até das palavras,
coisa nunca antes vista.
se me perguntarem algo hoje,
vai ela responder-lhes,
dirá algo engraçado de que não me lembraria,
e que ouvirei assim ao longe,
como se estivessem todos dentro de água,
ou eu dentro de água,
não sei bem.
se alguém me gritar não vou perceber,
se alguém me bater, sorrio de volta
e agradeço, por me tornar a dor
visível, palpável e localizável...
talvez até me faça esquecer por instantes de sentir
este vento frio (ou será água?
será um rio?) que passa impreciso
entre o coração e os pulmões e desagua em nó
algures entre a garganta e a boca do estômago
e me impede de respirar.
às vezes páro e reparo no silêncio
tão grande que herdei,
e no tanto espaço tão vazio
de repentemente.
"não te perdi a ti, perdi o mundo"
e responde-me ela do fundo do rio,
a boca abrindo e fechando e grandes bolhas de ar a dar à costa,
que foi assim que escolhi.
reparo que a angústia passou,
já não te espero.
podes vir a qualquer hora,
em qualquer dia,
podes não vir mais
se tudo fôr demais para ti.
sempre me deixaste com as mãos cheias
de tudo o que tinha para dar.
fecho a porta da imaginação por onde sonhei
que virias
e procuro outras janelas
por onde sair
que já não sinto meu este lugar.
vou deixar pégadas pelas estradas...
não perdi ainda todo o peso,
nem as amarras que me prendem ao chão...
mas não corto mais as asas...
se um dia quiseres,
terás que arriscar o voo
desajeitado,
arriscado
do
coração.
terás que escrever-me
na pele outra canção,
virar-me do avesso
e mudar-me a cor
pelo lado de dentro,
(para con-dizer com a tua)

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