muitas vezes (a maior parte das vezes) tenho muitas coisas a dizer a muito poucas pessoas, geralmente a uma só pessoa. quando essa pessoa não está presente ou disponível, não sei o que fazer com todas as palavras que me sobram: guardo-as nos bolsos, mas os bolsos ficam cheios depressa demais, digo-as a outras pessoas, mas não parecem entendê-las, calo-as, mas continuam a crescer em número e intensidade. não me resta outra solução senão escrevê-las. às vezes basta uma enumeração indiscriminada, outras vezes escrevo alguma coisa secundária em que perco algum tempo a pensar, outras vezes tenho que escrever exactamente o que queria dizer. tenho algumas palavras preferidas, poucas, raras, palavras de estimação que uso frequentemente, mas com cerimónia (luz, sombra, espera, raras, liberdade). às vezes apetece-me usá-las todas de uma só vez, ceder à urgência de dizer tudo (tudo o quê?), ficar reduzida a cinzas, vazio, ausência de mim em mim (paciência, procura, medo, paz, pássaros, urgência, rio). às vezes, por muito que queira falar, os outros pedem-me silêncio (distância, cinzas, ausência, silêncio, morte, espaço, vazio). que assim seja (parar, escrever).
Sem comentários:
Enviar um comentário