31 dezembro, 2010

2011


Três desejos muito pessoais para 2011, quase propósitos, embora eu não goste de propósitos... tenho tendência para não cumprir nenhum, por isso já nem vou escrever aqui: fazer exercício (que sei que preciso, mas nunca faço...) nem ler mais(que quero mesmo, mas nunca arranjo tempo, só nas férias). O que eu preciso, para que essas e outras coisas sejam possíveis, é de mais esperança (não precisamos todos?), disciplina e liberdade. (Mais vale começar já hoje e não deixar tudo para o próximo ano).

24 dezembro, 2010

oração


que o silêncio te diga
o que não te sei dizer.
que o silêncio te abrace
se não te posso tocar.

que o rio do tempo
te traga a salvo para casa,
seja ela no mar
ou noutro qualquer lugar.

[se a fizeres sobre as ondas
que as saibas navegar,
se a construíres nas nuvens
que aprendas a sonhar.]


22 dezembro, 2010

natal


há quem não acredite, há quem pense que é um hábito histórico-cultural, há quem só veja as aparências, há quem reúna a família, há quem se lembre de quem mais precisa, há quem gaste demasiado e ofereça muito pouco de si, há quem já não se lembre, há quem esteja tão sozinho como em todos os outros dias, há quem goste das decorações e se deixe ofuscar pelas luzes...

natal: um nascimento que começou há mais de 2000 anos e nunca mais parou de acontecer. que significado pode isso ter, hoje, para cada um?


21 dezembro, 2010

palavras tantas


muitas vezes (a maior parte das vezes) tenho muitas coisas a dizer a muito poucas pessoas, geralmente a uma só pessoa. quando essa pessoa não está presente ou disponível, não sei o que fazer com todas as palavras que me sobram: guardo-as nos bolsos, mas os bolsos ficam cheios depressa demais, digo-as a outras pessoas, mas não parecem entendê-las, calo-as, mas continuam a crescer em número e intensidade. não me resta outra solução senão escrevê-las. às vezes basta uma enumeração indiscriminada, outras vezes escrevo alguma coisa secundária em que perco algum tempo a pensar, outras vezes tenho que escrever exactamente o que queria dizer. tenho algumas palavras preferidas, poucas, raras, palavras de estimação que uso frequentemente, mas com cerimónia (luz, sombra, espera, raras, liberdade). às vezes apetece-me usá-las todas de uma só vez, ceder à urgência de dizer tudo (tudo o quê?), ficar reduzida a cinzas, vazio, ausência de mim em mim (paciência, procura, medo, paz, pássaros, urgência, rio). às vezes, por muito que queira falar, os outros pedem-me silêncio (distância, cinzas, ausência, silêncio, morte, espaço, vazio). que assim seja (parar, escrever).


20 dezembro, 2010

férias


primeiro dia de férias...(quais férias?)
como estou? doente. Que pontaria!!!


15 dezembro, 2010

tese


o desencontro não existe.
a probabilidade do encontro é directamente proporcional à vontade.


metáfora


fosse possível excluir todas as palavras menos uma, decantar, filtrar, destilar, purificar, extrair, recristalizar: uma palavra só que te dissesse, que atravessasse as fronteiras do corpo e do tempo e fosse em cada instante metáfora da tua presença em toda a parte.


dialéctica


nem tudo o que reluz faz frio,
nem tudo o que assombra é puro,
nem tudo o que seduz é bom,
nem tudo o que se diz é claro,
nem tudo o que se cala é escuro.


(da madrugada)


13 dezembro, 2010

perspectivas


e se tudo o que acontece for o melhor, mesmo que as vezes não pareça?
e se tentar fazer o melhor com tudo o que acontece, mesmo que às vezes não apeteça?


12 dezembro, 2010

Tiago Bettencourt & Inês Castel-Branco "Se Cuidas de Mim"




a propósito de coisas simples, uma canção simples. às vezes as coisas simples estão mais perto da perfeição. a amizade, por exemplo, uma coisa aparentemente simples...


coisas simples


há uma beleza nas coisas simples e claras, nas coisas que nos fazem bem e que às vezes parecem raras e outras vezes estão só escondidas pela quantidade enorme de tralha que nos ocupa os dias, sejam as listas intermináveis de coisas a fazer, seja a incapacidade de viver com mais liberdade e mais humildade. sou menos livre quando ignoro o que os outros precisam de mim e espero que eles sirvam as minhas necessidades, quando os manipulo mais ou menos conscientemente para servirem as minhas vontades, quando ajo por interesse e não de forma gratuita. sou menos humilde quando me recuso a pedir ajuda por me ter habituado a viver como se fosse auto-suficiente, como se não precisasse de ninguém. tantas coisas que podem tornar a vida mais difícil do que ela já é, desnecessariamente. a humildade é a verdade, já dizia a madre Teresa, é ser-se quem se é, não usar máscaras, não se sobrevalorizar e não se menosprezar, não parecer mais forte do que se é, não lutar continuamente para se esconder ou para se mudar aquilo que se é. É bom procurar a superação, é bom procurar fazer sempre o nosso melhor, mas se isso se tornar um fim em si podemos esquecer-nos de aproveitar o caminho. viver continuamente no limite pode tornar-nos piores pessoas, mais distraídas, mais cansadas, menos disponíveis para o que realmente interessa. Se o preço da superação for muito elevado, talvez seja caso para perguntar: será mesmo superação? não será maior superação aceitar os próprios limites e viver bem com eles?


06 dezembro, 2010

nina simone - how it feels to be free - montreux 1976




"i wish i would know how it feels to be free"
(i wish you to know how it feels to be free)



(uma mulher de armas!)


inverno


estico o teu silêncio sobre os dias
como um cobertor pequeno demais,
fica sempre um pé, um braço, uma hora
à mercê dos temporais.

escrevo para completar o cobertor.
dirás talvez: palavras a mais.
escrevo para aquecer a dor
nos locais onde o frio se demora.



de outra cor


ainda bem que chove por estes dias, assim não tenho que me preocupar com o que vestir para disfarçar a dor, porque o mundo é da minha cor. eu visto as nuvens e caminho incólume através da tempestade. eu deixo o frio brilhar através dos meus dedos. deixo desejos e medos soltos no vento para ele os dispersar. o meu grito é o ribombar dos trovões e o rumor da chuva sobre a terra sou eu a murmurar.


05 dezembro, 2010

paz


dentro do corpo um grito mudo,
quando a alma me pede revolução
e a razão surda lhe diz que não.
já sinto na pele as marcas da guerra,
já sinto na boca o sabor do medo.
desta vez peço paz, fico em terra,
não tenho forças para lutar em vão.
desta vez pedes paz, calo a ambição,
ouço o teu silêncio azul-denso-fundo.


do outro lado


hoje vou calar o desejo, a procura, o dever,
ignorar essa voz que me agita os sentidos,
vislumbrar um poema e não o escrever,
recusar essa sede de perto e de mais,
ver-te ao longe na rua e não te chamar,
ser de vento, invisível, desaparecer,
não ter nada a dizer e esquecer-me do resto,
já não ser, não pensar, ser silêncio profundo,
ser outro, ser além, ser o resto do mundo.


04 dezembro, 2010

liberdade


só é livre quem liberta.
não peças, dá.
não digas, faz.
não cales, sê.


integridade


"não é importante ser perfeito,
o que importa é ser inteiro"

(Jung)


verdade


não alimentes nenhuma mentira
(por mais ínfima que te pareça)
se queres viver na verdade.


02 dezembro, 2010

nada


não vou escrever, não vou escrever, não vou escrever, não vou escrever, (isto sou eu a não escrever) dói-me, mas não vou escrever, não vou escrever, não vou escrever, não vou escrever, estou calada, está-se mesmo a ver que estou calada, não digo nada, fico aqui quietinha e calada, não vou escrever, hoje definitivamente não vou escrever mesmo nada.


01 dezembro, 2010

um dia mais perto


caminho como quem traz permanentemente
um segredo invisível na mão,
uma pequena luz guardada sob a pele
na direcção do coração
que muda quase imperceptivelmente a cor
das ruas, dos outros, dos dias.


ouvi dizer II


dizem-me que cale, ignore, iluda,
que enterneça, que disfarce e entre-teça
e a seguir desapareça.
dizem-me que, com lucidez,
respeite as regras
e finja estar, tanto quanto possível,
absolutamente desinteressada.


ouvi dizer I


quando o que quero é dizer coisas simples:
pedra, mão, rio, mar, terra, fogo, ar
e só me saem redes intrincadas,
frases complexas, palavras complicadas,
devia respeitar as regras do jogo
e desaparecer, agora, enquanto não está ninguém a ver,
mas quem disse que eu sei jogar?


silenci-ar


Hoje é claramente um daqueles dias
em que está frio demais
para esperar pela noite em silêncio.

podíamos gritar...

[mas não há nada que cale melhor o frio
do que o instante imóvel,
o meu silêncio no teu olhar
o teu silêncio na minha boca,
o espanto]