10 dezembro, 2011

O olhar e o ver

em tempos de crise, e em todos os tempos, há pessoas que desistem e pessoas que reconhecem e agarram as oportunidades, há pessoas que bloqueiam e pessoas que sabem recomeçar uma, duas, três... as vezes que for preciso, há pessoas que se fecham em si mesmas e pessoas que se abrem aos outros. e não quero com isto dizer que o mundo se divide em dois tipos de pessoas, mas que nós, em diferentes tempos, podemos ter diferentes reacções aos acontecimentos, às pessoas, aos sentimentos. 

a qualidade do olhar é um factor preponderante. como vemos? o que vemos? continuamos a maravilhar-nos, ou tudo nos parece mais do mesmo? arriscamos expor-nos, ou temos uma imagem a defender? quando vemos injustiça, sofrimento,... sentimos-nos interpelados ou tornámo-nos indiferentes? o que vemos nos outros? os nossos pré-conceitos? os nossos pré-desejos? será que lá no fundo, bem no fundo, inconfessavelmente, ainda achamos que temos o direito de ser felizes e que os outros tem a obrigação de nos fazer felizes? ou vemos os outros como realmente são, com liberdade interior, sem julgar e sem exigir que correspondam aos nossos desígnios? 

viver atento, acordado, alerta para aquilo que nos rodeia não é um objectivo que em alguma altura está definitivamente conquistado, é uma atitude que se exercita constantemente, é uma meta nunca alcançada, podemos sempre fazer melhor, sempre. será que fazemos?

06 outubro, 2011

A vida inteira



Recuperamos, nas férias, dos cansaços, dos desencantos, das derrotas, dos desencontros,... Recuperamos a paz. Recuperamos os desafios e os desejos que deixamos adormecer dentro de nós. Encontramos outros e (re)encontramo-nos as nós mesmos, iguais, mas diferentes, com mais tempo e mais verdade para ser e para estar.
E assim, iguais, mas diferentes, somos novamente lançados para a rotina, para os trabalhos e os cansaços, as alegrias e os desencantos, as vitórias e as derrotas, os encontros e os desencontros,... Como reagimos? Com que força resistimos? Com que pressa desistimos? De que fibra somos feitos? De que nos alimentamos? Que sentimentos nos invadem às primeiras contrariedades? Esperança ou desespero? Paciência ou raiva? Em que é que mudamos afinal? O que é que trazemos de novo para cada novo dia? O que é que trazemos de novo para o dia dos outros?

Silencio-me e observo. Tantas caras, tanta vida, tantas vozes, tanta pressa, tanta música, à minha volta tudo se movimenta. A cada novo dia, a vida inteira começa. Em cada novo dia, a felicidade reside inteira, disponível, semente à espera de ser árvore. Cada novo dia é uma oportunidade inteira para mudar a minha vida. A minha vida vive-se sempre, inteira, num só dia: hoje. O que dei eu hoje? O que recebi? O que desperdicei?




Paciência



"Uma árvore é uma semente que cresce devagar e em silêncio."
 Bruno Munari



12 setembro, 2011

Sem nada a perder




medo de perder,
medo de sofrer,
medo de viver,
medo de morrer,
medo de ser,
medo de parecer,
medo de errar,
medo de acertar,
medo de ter,
medo de não ter,
medo de ter medo,
...



e se pudéssemos viver sem medo?



01 setembro, 2011

Magis 2011: Peregrinar

Ainda estou a tentar fazer o balanço destas férias. E não me atrevo a grandes conclusões por suspeitar que há experiências, pessoas, encontros, descobertas cujas repercussões só poderemos avaliar mais tarde, pelos frutos. As árvores (e as vidas) avaliam-se pelos frutos.
Tenho para mim que não é só a viagem que me seduz, mas todas as dimensões do peregrinar. Viajar caminhando, devagar, com tempo para estar nos lugares e para estar com as pessoas, com tempo para conversar, com tempo para parar, com tempo para ter tempo. Viajar com pouco, deixando o supérfluo para trás e procurando o essencial. Viajar com as dificuldades e fragilidades que o caminho faz questão de revelar. Viajar com sentido e objectivo para uma meta que não é necessariamente o lugar de destino, mas um novo olhar, uma sabedoria que do caminhar se traz para a vida. E depois, cada destino é também o ponto de partida para um nova viagem, para um regresso, ou para uma nova partida.
Pode às vezes parecer rotineira a viagem da vida. Daí a importância de trazer um olhar renovado para a rotina de todos os dias. E a coragem de enfrentar medos e de nos propormos a ultrapassar obstáculos, mesmo que eles nos pareçam, à partida, montanhas intransponíveis. Afinal, depois de subir a primeira montanha impossível todas as outras nos parecem mais acessíveis.
Podemos nivelar a nossa vida por baixo, correr poucos riscos, viver agarrados às nossas velhas seguranças, achar que não somos capazes de mais e melhor, mas é mentira. Os ideais só são ideais se forem elevados. E há algum risco maior do que a vida desperdiçada? O melhor é não nos satisfazermos com pouco quando o coração pede magis. Correr o risco de trilhar vales e montanhas. Até porque as montanhas sobem-se todas da mesma maneira: um passo de cada vez. Entretanto, convém não esquecer de aproveitar a viagem e a paisagem, porque as metas que valem a pena são difíceis de alcançar.

Magis: Peregrinação entre San Sebastian e Arantzazu - 9 a 14 de Agosto de 2011

26 agosto, 2011

24 agosto, 2011

No coração do mundo


há algo na viagem que nos fascina e seduz.
que nos chama por dentro. sem palavras.
um outro mundo lá fora. longe das nossas seguranças.
uma busca comum que silenciosamente nos guia:
para onde vai a tua vida?
para onde vai este dia?
de todas as cores. de todos os lugares.
para lá dos medos o invisível reluz.
um desejo onde desconhecidos se reconhecem.
um amor que torna próximos os distantes.
um mundo inteiro lá fora. à nossa espera.

03 agosto, 2011

Contagem (de)crescente


Dia -1

Música: CD "Em fuga" - Tiago Betterncourt & Mantha
Objectos: Mochila, lista de coisas a levar, coisas propriamente ditas
Acção: Fazer a mala.

O que precisamos realmente? O que levamos e o que deixamos para traz? Viver com mais. Viver com menos. O que nos faz realmente falta? O que podemos dispensar? Torna-se mais fácil decidir quando sabemos que vamos ter que carregar a mochilas às costas no caminho... (mas não temos sempre? não carregamos o peso das coisas todos os dias?) As escolhas que fazemos influenciam a viagem. Que viagem queremos fazer? Que valor damos realmente às coisas? Será que elas têm esse valor? Ou poderíamos viver melhor sem elas? Fazer escolhas. Fazer a mala é fazer escolhas. Fazer a mala é um exercício de liberdade.


Preâmbulo


a partida marcada. daqui a dois dias. e a mala por fazer. ainda. tempo não me tem faltado. porquê? adiar. sou perita em adiar. não pensar. para não ter que pensar. em quê? na partida. na chegada. no espaço entre. no tempo durante. para não pensar. para não ter medo. de quê? sei lá. do barulho. do silêncio. da multidão. da solidão. de tudo. de nada. de perder. de encontrar.

a viagem marcada. definitiva. agora já não há nada a fazer. já não há tempo. já nem sequer há tempo para não pensar.


23 julho, 2011

oportunidades


a vida é frágil. parece energia fulgurante. parece intocável. parece garantida.
às vezes vivemos como se fôssemos imortais. desperdiçamos. energia. tempo. oportunidades. dizemos: haverá outras oportunidades, mas não é exactamente verdade.
as oportunidades que desperdiçamos não voltam. as oportunidades que desperdiçamos não se repetem.
haverá outros tempos, outras pessoas, outras oportunidades, nós próprios seremos outros.
a inacção é uma forma de acção. as oportunidades que virão, serão outras. mesmo outras. melhores? piores? é muito difícil sabê-lo.


perspectivas


Às vezes a distância... é o melhor remédio.
Quando estamos perto demais nem sempre temos consciência do plano geral.
Dava jeito, às vezes, conseguirmos ver-nos (a nós, às nossas opções, às nossas relações) à distância.


10 julho, 2011

esse lugar invisível que te habito sem saberes II


É provável a ilusão. O desejo tem destas coisas. A vontade férrea de persistir, de se ultrapassar, de passar do pensamento à acção. É capaz de criar qualquer ilusão para servir o seu ardil. Eu não posso ser quem tu desejas, não posso ser quem tu precisas, o tempo todo. É uma ilusão, mas a sensação do meu desejo é essa, a ilusão do meu desejo é essa: é seres em mim, já, o que ainda não sabes e eu ser em ti o que ainda não sentes. Desde sempre. Desde que nasceste e até morreres e mesmo que nunca o venhas a saber. Eu ser em ti, desde sempre, esse lugar invisível que te habito sem saberes.


22 junho, 2011

esse lugar invisível que te habito sem saberes


gastei os meus passos a caminhar,
mas não cheguei a nenhum lugar.
devolvi o meu corpo à terra,
mas ela não o recebeu.
abri o meu flanco para dar de beber aos pássaros,
mas eles não se aproximaram.
voltei para casa, sozinha, sem ti,
mas haverá algum lugar onde tu não estejas?


Radiohead - Fake Plastic Trees



(nada a acrescentar)


18 junho, 2011

Distâncias


Há momentos em que estamos perto demais.
Às vezes a diferença mínima de alguns milímetros é o suficiente para ultrapassar a barreira da distância de segurança mínima garantida, uma linha invisível, quase, quase imperceptível.
Em cima da linha não é possível ficar. Ou se mergulha de cabeça. Ou se recua sem hesitar.
Acontece, às vezes, que o desejo quer avançar quando a razão quer recuar. Isto não torna mais difícil a decisão (para quem tem a certeza de quem é e do que quer para si). Às vezes queríamos poder acreditar na ilusão de que outra decisão é possível, mesmo quando sabemos que não é. Queríamos poder adiá-la quando no fundo ela esta tomada à partida.
O desejo ameaça sempre que vai dar luta, mas não se pode ceder à chantagem só para tentar manter uma paz aparente. Se a verdadeira paz quer ser (re)conquistada vamos à luta que o desejo tem mais garganta que poder. (Lutar faz bem. Aquece nas noites frias. Traz diversidade à banalidade dos dias. Fortalece os músculos interiores da renúncia e da vontade).


entrega


o que realmente me emociona são as pessoas.

pessoas com ganas de viver, orgânicas, de alma e carne e liberdade e desejo.
pessoas capazes de subir ao palco e dar tudo o que têm lá dentro, de bom e de frágil, de coragem e de medo, no fundo, tudo o que são.


14 junho, 2011

Caetano e Maria Gadú - O Quereres (Ao Vivo)



sabe bem ouvir cantar assim ao fim da tarde (ou a qualquer hora) em casa (ou em qualquer lugar). sabe a férias quando há ainda muito trabalho pela frente, mas apetece, de repente, fazer uma pausa para respirar. parar como quem tem todo o tempo p'ra parar, sem correr, parar só, mesmo, mesmo devagar (como um beijo devia ser: instante parado no tempo de quem não tem pressa de partir, nem de chegar).

eu estou descompassada com a vida,
a vida a correr e eu perdida,
não sei se atrasada ou diante da terra prometida
(sem a ver).
o desencontro às vezes sabe a despedida,
mas não me parece perdido o tempo que perdi
(e ainda perco)
a aprender a perder.

liberdade é coisa de difícil apetecência, menos de apetecer e mais de paciência.
às vezes apetece menos, de querer estar perto demais.
às vezes apetece mais, de querer voar p'ra bem longe, onde não se toca nem se vê.
às vezes parece de menos, de não haver espaço para se ser quem se é.
às vezes parece demais, de quase roçar a solidão.
há que estudar a arte da iluminância, menos de ânsia e mais luz (e de esperanc(i)a)
para aprender a ganhar até quando se fica a perder.



10 junho, 2011

o dia depois de ontem


este é o dia seguinte.
por isso convivem em mim dois sentimentos contrastantes. a satisfação pelo trabalho realizado. e um certo vazio, difícil de explicar... (saudades já de algo que terminou? ou a difícil tarefa de me re-equilibrar depois de ter exigido tanto de tudo, e de todos e de mim.)
às vezes penso que outra forma de viver e de trabalhar deve ser possível, eu é que ainda não a descobri, por isso gasto-me assim, na primeira pessoa do singular, no presente do indicativo. por isso às vezes o medo. porque entregar (me) assim é arriscado.
damos e recebemos, mas onde estamos? se estivermos só no que damos, arriscamos ficar sem nada? ou damos sem medo e em liberdade porque o fazemos a partir do centro, do núcleo duro daquilo que somos e daquilo em que acreditamos? e não tememos esvaziar-nos porque sabemos que o amor não se gasta nem se divide, antes se multiplica nas mãos de quem o dá.

29 maio, 2011

Modus operandi


vai aonde queres ir,
diz o que tens a dizer.
sê educado e sensato,
humilde, mas não condescendente,
corajoso, mas não intransigente,
livre acima de tudo,
na relação com as coisas e com as pessoas,
na certeza de que tudo passa,
(até a vida)
e portanto não tens nada a perder.


23 maio, 2011

70 km/h


no sábado levava a avó e a Lina no carro:
"olhe aquela é a casa do Fernando, está a ver?"
"e agora, já sabe onde é que estamos?"
"não, ainda não atravessamos a ponte"
"olhe o milho como está grande, nasceu muito bem"
percebi finalmente por que é que o meu avô conduzia tão devagar.
porque quando se conduz rápido demais, como eu normalmente conduzo, não se consegue ver se o milho já nasceu.


17 maio, 2011

GIVE CHILDREN A HEALTHY START IN LIFE


Why Bother? from ONE Campaign on Vimeo.


New and effective vaccines are now available to help prevent two of the biggest killers of children under 5: pneumonia and diarrhoea. With these vaccines we can save 4 million kids' lives in the next 5 years. But we've only got a few weeks to make it happen. Next month world leaders are meeting at the Global Alliance for Vaccines and Immunisation pledging conference to decide how much they will support the roll out of these vaccines in developing countries.


Help protect children for a lifetime by adding your name here:

http://www.one.org/international/actnow/vaccines/o.pl?id=2318-4763128-UKSEpRx&t=3



14 maio, 2011

Receita


um oásis.
só preciso de cinco minutos de oásis por dia para me abstrair da quantidade de trabalho que tenho pela frente e descansar.
e um café.
um café depois do almoço para enfrentar a tarde, noite, madrugada (o tempo que for) com energia aproximadamente constante.



22 abril, 2011

Arvo Part - Fratres For Cello And Piano




pela música não pelo filme (embora tenha gostado do filme).
pelo silêncio a que (est)a música nos impele.
e mais não digo: (hoje).


18 abril, 2011

sentido de oportunidade III


às vezes (muitas vezes) espero pelo momento certo para falar: quando houver silêncio, quando alguém fizer a pergunta certa, quando servirem o café, quando chegar mais alguém, quando alguém se for embora, quando for a hora certa... às vezes (às vezes) não chego a falar.


sentido de oportunidade II


enquanto não as conhecemos as pessoas são caras indistinguíveis na multidão. podemos passar por elas, vezes sem conta, sem as vermos. depois de falarmos com elas uma vez, passamos a vida a encontrá-las, mesmo sem querermos.


sentido de oportunidade I


mais do que muitas palavras,
mais do que palavras a mais,
o silêncio diz-te muito bem
e cala-me ainda melhor.


14 abril, 2011

Páscoa


o fim e o princípio sobrepostos,
lugar onde se cruzam todos os caminhos,
ponte para lá das palavras e dos gestos.

um amor que no silêncio se revela,
que na humildade se traduz
em entrega desmedida.


04 abril, 2011

É para já!


Passo a vida a adiar, coisas pequenas, coisas grandes, coisas assim-assim. Adio a hora de ir dormir, adio o sono para outro dia, adio a hora de acordar, adio o que tenho que ler, adio o que tenho que escrever, adio o que tenho que compor, adio o que tenho que estudar, adio a oração para amanhã, adio o exercício para depois de amanhã, adio e-mails que tenho que enviar, adio reuniões que tenho que marcar, adio pessoas que devia visitar, adio o que tenho para dizer, adio o que tenho para sentir, adio, adio, adio...

Facilmente, reparo, me habituo a adiar não só as coisas chatas, mas também as coisas boas, por medo, preguiça ou distracção. adio a felicidade para outro dia por que me esqueço de viver bem o tempo, as oportunidades, as pessoas de todos os dias...



E se hoje começar a olhar para os dias de outra forma? Se em vez se adiar decidir: é para já! É para já o trabalho, é para já deitar cedo e cedo erguer, é para já fazer exercício, é para já aproveitar melhor o tempo e ter tempo para ter tempo e ter tempo para descansar e ter tempo para estar. É para já a vida!



31 março, 2011

Haikus - Tentativa 1


na multidão de anónimos
caminhar.
silêncio.




no muro dos dias
tricotar janelas,
ver.




tempo de dar.
tempo de parar.
(in)decisão.




entra pela porta fechada.
a verdade nos gestos, o silêncio na boca.
a beleza.




ruído de passos.
ninguém.
a memória.


22 março, 2011

memória II


pela noite adentro.
o relógio a morder-me os calcanhares.
lentamente.


memória


à volta, à volta, à volta de um trabalho sobre memória...
parece que me tenho esquecido.


21 março, 2011

The National - England (Live Directors Cut)




repetidamente, por tempo indeterminado (acho que me estou a repetir)


The National - Runaway (Live Directors Cut)




estou viciada. posso ouvir The National todos os dias, as mesmas músicas, repetidamente, por tempo indeterminado.


20 março, 2011

dar... ou dar-se


dar sem querer nada em troca... é difícil? muito. mesmo quando nos convencemos de que somos desinteressados, muitas vezes esperamos uma retribuição, um reconhecimento, talvez apenas um obrigado bastasse, mas nada, nada de nada (mesmo nada) é difícil de digerir.

quanto mais não seja, dar dá, muitas vezes, alguma satisfação interior... mas dar pelo bem do outro e não para nos sentirmos melhores pessoas... dar a quem nos irrita, dar a quem nos tira (a paz e paciência), dar a quem nos incomoda... é difícil? muito.

e quando digo dar... não quero dizer necessariamente dar alguma coisa material, às vezes quero dizer dar-se. é difícil? muito, mas só o facto de estarmos atentos faz-nos encontrar muitas oportunidades de dar... oportunidades que temos todos os dias e que por distracção ou preguiça desperdiçamos.


15 março, 2011

é só isto?


Não gosto de improvisar, gosto de me preparar, não gosto de me sentir sem chão, gosto de controlar, gosto de saber a resposta certa antes de ouvir a pergunta... mas, às vezes, tanta segurança sabe-me a pouco.
Às vezes, pergunto-me: é só isto? Deve haver alguma coisa lá fora pela qual valha a pena arriscar, alguma coisa pela qual valha a pena lutar, alguma coisa que ultrapasse a banalidade dos dias, alguma coisa na qual o coração se reconheça. Deve haver.



09 março, 2011

(in)versão


quando não te vejo é que não te esqueço,
quando não me falas é que não me calo,
quando não me tocas é que te desejo,
e neste desencontro nada te subtrai,
só se multiplica a tua longa ausência.

quanto mais analiso a raiz do questão
mais me confundo e mais me convenço
da ausência de ciência nesta (in)consciência.

quanto mais verifico a insolução
mais me critico e mais me disperso,
mais te encontro e mais me afasto da razão.

esta (in)consciência ignora as leis da física
e da matemática e da linguagem e da gestão
e outras que tais...

mas eu não.

se a (in)consciência ignora todas as leis
eu ignoro a (in)consciência e outras que tais
e da tua presença me subtraio:

se te vejo mais depressa esqueço,
se me falas eu não te respondo,
e se me tocas não te quero mais.



06 março, 2011

2+2=5


na música, como na vida, é essencial ser generoso.
tudo aquilo que se dá de forma desprendida, despretensiosa, sincera e alegre é sempre melhor do que aquilo que pensamos que tínhamos para dar.
a música, como a vida, é feita de relações, onde, às vezes, se observa inesperadamente que o resultado final é superior à soma das partes: afinal sempre há lugares onde 2+2=5. E podiam ser muitos mais...

hoje, ou melhor, ontem, foi um prazer encher de música e vozes e vida o palacete pinto leite, hoje esvaziado dos móveis, dos instrumentos, dos professores e alunos do conservatório de música, mas não esvaziado da sua identidade, ou, por que não, da sua personalidade. porque há casas que absorvem e reflectem a história e as estórias que as habitaram, ecos de um passado que se projectam no presente, que nos contaminam e nos inspiram a fazer melhor. [somos duração e temos dentro de nós todos os tempos: o que já fomos, o que hoje somos e o que seremos.]


26 fevereiro, 2011

disciplina


muitas vezes sou prisioneira dos meus sentimentos e desejos.
hoje saio em liberdade condicional por bom comportamento.


22 fevereiro, 2011

a outra face


os nossos pré-conceitos afectam de forma determinante a atitude que temos perante os desconhecidos, se sorrimos ou não, se somos mais ou menos pacientes, se somos mais ou menos sinceros, ou melhor, mais ou menos parecidos com o que somos realmente.
as nossas experiências anteriores com as pessoas afectam a forma como as tratamos da segunda, da terceira, da décima e da milésima vez porque é muito difícil ultrapassar diferenças e mágoas prévias para arriscar ser gratuito e olhar com um olhar renovado uma e outra vez.
por último, a nossa opinião em relação a nós próprios, a nossa auto-estima, aquilo que achamos, mais ou menos conscientemente, que merecemos (ou não) reflecte-se a todo o momento nas nossas opções e acções em relação aos outros (como uma espécie de profecia que se auto-realiza). quantas vezes nos desvalorizamos silenciosamente, quantas vezes esquecemos que o valor intrínseco de cada um é completamente independente das qualidades e dos defeitos, do QI, das aparências, ...
eu que me reconheço como num espelho em todas estas armadilhas (dos pré-conceitos à auto-desvalorização) fico a pensar: como seriam as nossas relações se nos libertássemos de todas estas correntes?


18 fevereiro, 2011

horários


gosto da manhã. da luz da manhã. da sensação de que todas as coisas são ainda possíveis. do pequeno-almoço. do cheiro a café.
gosto da noite. do silêncio. de conduzir pelas estradas vazias. das conversas intermináveis. do luar. de ver o dia nascer. de ouvir o dia nascer.
gosto de dormir muito, mas não me consigo deitar cedo. por isso no tempo de aulas durmo pouco e vejo muitas manhãs. nas férias durmo muito e vejo muitas noites, poucas manhãs.

07 fevereiro, 2011

de férias...


quinze dias de férias muito ansiados depois de um semestre exaustivo. nos primeiros dias dormi até tarde e não fiz nada de jeito... o que rapidamente se tornou enervante. será que estou viciada no trabalho? será que já não consigo não ter nada para fazer? é triste. já o tinha sentido nas férias de verão. se não tenho nada marcado não faço nada, nem sequer saio de casa e fico a vegetar. rapidamente fico deprimida e as férias tornam-se cansativas e não o contrário. A solução portanto é arranjar objectivos:

Ir ao cinema:
Biutiful
Cisne Negro
Indomável
O discurso do Rei

Ler:
Tudo o que sobe deve convergir - Flannery O'Connor
1 Km de cada vez - Gonçalo Cadilhe
Northanger Abbey - Jane Austen
Antígona - Sófocles
A queda de um anjo - Camilo Castelo Branco
Fragmentos - Novalis
Poesia - q.b. - Daniel Faria, Eugénio de Andrade, Sophia de M. B. Andresen

Reler:
Terra dos Homens - Saint-Exupéry

Ouvir:
Du Temps & de L'instant - Jordi Savall,...
Mongrel - Mário Laginha Trio
Sinfonia nº 1 e Vathek - Luís de Freitas Branco
Integral das canções - Luís de Freitas Branco
Lieder - Vianna da Motta
Xinti - Sara Tavares
Lungs - Florence & the Machine
Forbidden Fruit - Nina Simone
B Fachada - B Fachada
Riot on an empty street - Kings of Convenience
Kid A - Radiohead
Boxer - The National

Rezar
Escrever
Tocar piano
Tocar guitarra
Arrumar o quarto (...)
Fazer exercício (.............)
Ir ver o mar
Não fazer nada
Estar com os amigos
Fazer um plano para o dia
Ir comer jesuítas à pastelaria Moura

serão objectivos a mais? vou ficar frustrada se não conseguir atingir os objectivos? não sei, mas li algures que fazer planos é a melhor maneira de evitar a inércia e a indecisão. e não fazer planos também não parece estar a resultar... por isso vou tentar!


29 janeiro, 2011

Mais


queremos sempre mais, mais liberdade, mais paz, mais felicidade, mais justiça, mais realização, mais verdade, mais amor, mais, mais, mais... mas será que procuramos no lugar certo? ou será que nos deixamos absorver pela procura? os tempos sucedem-se, uns mais fáceis, outros mais difíceis, às vezes parecem atropelar os nossos planos perfeitos e as nossas óptimas intenções...
sei que a liberdade será sempre incompleta, que a felicidade será sempre imperfeita. olho para dentro e percebo que já tenho, no fundo, a paz e a liberdade que preciso para o dia de hoje, para o tempo presente. desconcertante, não é? inesperadamente simples. queremos sempre mais, mas o tempo não se apressa, as conquistas demoram o seu tempo (às vezes a vida inteira) e cada tempo traz as suas próprias respostas.


28 janeiro, 2011

(des)existir III


há uma linha que marca a fronteira. há uma linha para lá do cansaço, para lá da razão... e cada passo que dás nessa direcção aumenta grão a grão o teu desfasamento com o resto do mundo. o mundo vai ficando cada vez mais longe e desfocado. o corpo cada vez mais lento e mais cansado. quanto tempo se pode caminhar nesse deserto? quanto tempo vive uma árvore sem raiz? quanto tempo até o corpo desistir? quanto tempo até o vento apagar os teus passos e não saberes mais para onde voltar? quando tempo? um dia? uma hora? um passo?


20 janeiro, 2011

(des)existir II


às vezes a persistência é boa. é preciso saber esperar.

às vezes a persistência é teimosia. é preciso saber perder.


18 janeiro, 2011

o lado-luz dos dias-sombra


hoje o meu cansaço é daqueles que tem raízes antigas e profundas, daqueles que continua a doer no corpo mesmo depois de dormir. [daqueles que quase me faria escrever (te).]
hoje o meu cansaço é também mais lúcido: vejo como me tenho deixado governar pelo trabalho e não tenho respeitado os meus limites, vejo que tudo o que me dói é falta de liberdade. falta de liberdade se só tenho tempo para trabalhar e se me desiludo como se tudo dependesse de mim. falta de liberdade se vivo centrada na minha vidinha, neste círculo fechado e pequeno onde só cabem as minhas necessidades urgentes, as minhas pessoas ausentes, as minhas dores, os meus cansaços, os meus objectivos. falta de liberdade se me iludo com os meus desejos e invento papéis para os outros, e desespero com a espera, e me angustio com as ausências e com a liberdade dos outros. [por que é tão difícil respeitar a liberdade dos outros de ficar ou de partir?]. falta de liberdade se por desilusão me isolo e ignoro a vida que chama lá fora todos os dias: tenta mais, faz mais, vive mais, dá mais! falta de liberdade se me ocupo e ignoro a vida que me chama cá dentro: acredita mais, faz melhor, vive em paz, dá gratuitamente!
no meio do cansaço percebi também que preciso muito desse lugar chamado casa e que esse lugar não é simplesmente um lugar-lugar, mas sim um lugar-pessoas. a minha casa é onde estão as minhas pessoas-casa. e quando estou muito cansada descanso melhor se estou ao lado delas. às vezes não preciso sequer de desabafar com elas, basta-me estar com elas e ouvi-las e falar das coisas banais dos dias e das coisas importantes que nos angustiam, que nos movem, que nos comovem, basta-me estar com elas sem dizer nada para me sentir em casa e ficar melhor. [se o cansaço me faz olhar melhor para mim, para os dias e para os outros, então não pode ser mau. afinal, nada é só bom ou só mau.]


15 janeiro, 2011

Coldplay - See You Soon




essencial para a felicidade de cada dia é a confiança. cada dia é uma oportunidade de fazer melhor, de ser melhor, mas há muitas coisas que não se conseguem controlar. tantas vezes nos deixamos arrastar pela correria do mundo, pela falta de tempo para parar, para estar. tantas vezes nos deixamos confundir pela distância entre o que desejamos e a realidade. é essencial confiar: "para tudo há um momento e um tempo para cada coisa que se deseja debaixo do céu". tempo para procurar e tempo para esperar. tempo para falar e tempo para calar. tempo para abraçar e tempo para evitar. tempo para encontrar e tempo para perder.


13 janeiro, 2011

dias de inverno e erosão


sentimentos e ilusões em constante confronto com a realidade - a erosão a gastar-me por dentro, a esculpir fronteiras, montanhas, falésias interiores. o cansaço à flor-da-pele a estender raízes para o lado de dentro... não sei por onde andam, mas às vezes sinto-as: pequenas vibrações, pequenas (in)dores.
cada palavra que escrevo é silêncio que me ocupas; a cada palavra-passo estou um instante mais longe. a cada instante inspiro o que te afastas e paro, espero. em cada instante adivinho o princípio, o meio, o fim, realidades separadas ou diferentes existências condensadas numa mesma realidade, presentes em potência em cada pessoa, em cada oportunidade, em cada escolha? isto é o princípio, ou o princípio do fim? ou somos um meio para atingir um fim? ou somos fins, mas não há meio de principiarmos?


11 janeiro, 2011

citação


"o esforço é uma espada de dois (le)gumes"


09 janeiro, 2011

o princípio, o meio, o fim


em cada tempo, acontecimento, pessoa ou relação estão contidas, em semente, o seu princípio e o seu fim. não os conseguimos ver, mas estão cá. não os consigo ver, mas trago-os dentro de mim. o princípio, o meio, o fim. não posso ver, mas posso confiar. olá, adeus, talvez sim, talvez não, quem sabe?...


fim do semestre


estes são dias de hibernar. não estou cá. estou retida. estou contida. estou ausente.


05 janeiro, 2011

(des)ilusão


Há dias em que todas as horas são distância.


04 janeiro, 2011

(des)existir


luz e sombra
angústia e sede:
a distância tece-te
em meus dedos.
já não sou livre,
já não sou perto,
sou a retórica dos teus medos,
sou a esperança esquecida,
sou a voz dos teus segredos,
sou a ausência da criança,
sou a manhã branca e mordida
pela pulga na balança.
sou as mãos do teu silêncio,
sou as noites que não dormes
e as insónias que não tens.
sou a palavra escondida
na tua página vazia,
sou a rotina que te azia.
sou o verbo que desistes,
sou o substantivo que não usas,
sou complemento directo a que resistes.
sou o cansaço que não dizes,
sou tua dor que não descansa,
sou o teu sonho por cumprir
por isso levanta-te e dança
que eu estou decidida,
vou ficar (estou perdida,
não tenho nada a perder).


03 janeiro, 2011


"Houvesse um sinal a conduzir-nos
E unicamente ao movimento de crescer no guiasse. Termos das árvores
A incomparável paciência de procurar o alto
A verde bondade de permanecer
E orientar os pássaros"


Daniel Faria
in "Poesia" (2009)
Edições Quasi